terça-feira, 20 de setembro de 2011

Volta ao lar


Fim do dia, lá vinha o grande homem. Aquela reserva moral tanto podia vir mais cedo, direto do trabalho, quanto podia chegar mais tarde, vindo do puteiro, onde batia ponto com frequência e regularidade.


De qualquer modo, da labuta ou do lupanar, ele sempre chegava com a mesma postura de estátua equestre, muito embora viesse a pé. Evidente que, naquela cabecinha, o sujeito devia se imaginar o cavaleiro. A realidade, entretanto, informava que ele vinha de condução; vestia um terno daqueles, que se deformam à primeira olhada, gravata e camisa acompanhando o padrão; os sapatos mereceriam um capítulo à parte, um par por ano, sempre da mesma marca — cujas principais virtudes eram a feiura e o preço baixo, — capazes de emanar os mais pestilentos miasmas após meros trinta segundos nos pés, imagine então após meses naqueles pezinhos.

Ele entrava, passava por todos sem parar, no máximo meneava um pouco a cabeça — impossível saber se xingava, se cumprimentava, — e ia se aboletar diante do grande amor de sua vida: a tevê. Dali, só sairia para dormir; ali, só falaria no caso de algum corpo se interpor entre ele e a tela (“Vai sair da frente, ou quer levar porrada, filha da puta?!”).

Assim morria o dia naquela coisa, quer dizer, naquela casa.

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